terça-feira, 19 de outubro de 2010

Obrigada por ter me abandonado nesse dia, rinite

Começar um texto dizendo que eu estava atrasada é um retrocesso, uma redundância, pra não dizer coisa pior. Eu vivo atrasada, pra minha sorte ou azar. Mas o fato é que eu estava mesmo saindo atrasada do banho para um compromisso que já não lembro qual é.

Arranquei a toalha rosa do box, me sequei voando e joguei a mão no desodorante que fez um psiiiii desanimado.

Vazio.

Sim, a Lei de Murphy é algo super presente na minha vida.

Pois lá fui eu tentar encontrar um desodorante novo na minha costumeira bagunça, vulgo balcão da pia. No meio duma sacola amarela de freeshop, estava ele. Arranquei-o feliz do submundo da desordem e puxei a tampa.

O tsiiiiiiiiill saiu com força da lata branca e junto dele veio o bairro gótico e um prato de tapas. Callamares bem sequinhas, por favor. Uma taça de sangría e um monte de amigos heteronacionais. Senti o sono que movia minhas pálpebras na melhor aula de espanhol sob o sorriso de Sarah, a professora. E então eu jogava volei em Barceloneta e eram mais de dez horas da noite. Veio o zunido do metrô e meu quarto pequeno com travesseiro alto. A lomba para chegar até em casa, o calor e uma sensação inédita. Barcelona era inédita para mim e eu pra ela. E nós nos amávamos assim. Todos os dias. Até o dia que revivi tudo em dois minutos dentro do meu banheiro porto-alegrense.

Saborear o aroma do desodorante que eu usava na Catalunya só perde para o borbulhar do arroz com banha da minha vó.

domingo, 17 de outubro de 2010

Devaneio - Gisele

Em um boteco entranhado no bairro Gótico, uma brasileira e americana dividem a mesma mesa.

Enquanto eu admirava meu bocadillo salivando, Elisabeth me encarou séria.

-Mariana?

-Que?

Chegaram as patatas bravas. Largo o bocadillo e espeto uma como um apaixonado que encontra a amada.

- A Gisele tá mesmo grávida?

Adoro esse sabor quente e picante escorregando pela minha garganta.

- Que tu disse mesmo Elisabeth? – já mirando outra.

- Se a Gisele tá grávida.

-Gisele? - franzo o cenho.

Meu cérebro deu uma, duas, três voltas. Devo estar anêmica por culpa da ausência de proteína bovina, só pode.

- Bündchen, Mar-i-ana. Ela tá grávida?

Socorro, senhor. Me proteja dessas cabeças americanas.

- Ih, Elisabeth. Ela tá mais perto de ti que de mim, hein, pode ter certeza. Não faço a mínima ideia.

Aos bocadillos, por favor.