Toda criança quer desenhar na parede. Nenhuma mãe deixa desenhar na parece. Por motivos óbvios, claro. Rabiscar o concreto é forte na infância. Não há quadro negro que substitua.
As crianças viram adolescentes e permanecem desejando escrever. Fixar-se em algo. Talvez a insegurança da juventude os faça correr para os banheiros das escolas, para as carteiras. Mas sempre vem um professor que manda limpar. E lá se vão os registros.
Aí, a criança que tentava desenhar no muro da casa ou usava a parede do quarto para receber declarações dos amigos, passa no vestibular. Entra na federal. Dá um passo na idade adulta. No mundo das responsabilidades, em tese. Agora precisa pensar na carreira, no futuro, em dinheiro.
E o que ela encontra?
As cadeiras, os professores, os colegas e as cervejadas durante a semana. O diferente.
Também.
Mas tinha algo de criança lá. Uma sala toda rabiscada, onde qualquer um podia escrever. E, importante, nenhuma mãe ameaçava colocar de castigo. Ela foi feita para se deixar marcar. Não é um muro de lamentações. Seria de confirmações? Ou de contestações?
Os que tinham de entrar na idade adulta voltavam a ser crianças ali. Soltavam as feras desenhando, escrevendo, declarando. Um alívio num mundo de insanidade. Um pouco de doce insanidade, para ser mais exata. E aquele concreto todo era deles. De todos que fizeram a prova que os deixou entrar naquele portão, ser sujo de tinta e se matricular. Um pedaço de cada, era disso que eram feitas aquelas paredes. Pareciam intocáveis. Perenes como pouca coisa nessa vida. As nossas paredes. Os nossos desenhos. Os nossos escritos. Os nossos devaneios.
Como uma mãe que traz o pano para a limpeza ou a professora que decide fazer um mutirão, nossas marcas encontraram o perigo. Havíamos esquecido que uma tinta qualquer poderia cobri-las. Poderia nos tirar dali. E tirou.
Voltamos das férias para a vida adulta. Nosso pedaço de infância não existia mais. Tudo limpo, branco, imune, extirpe. Nos chamaram para o mundo dos grandes. Pintaram as paredes do Dacom.
Metáforas da vida
Há 10 anos
2 comentários:
O DACOM está branco... pedindo novas idéias. Crescer é se renovar.
"Apagaram tudo, pintaram tudo de cinza, só restou no muro tristeza e tinta fresca"
Grande Marisa Monte :D
Mariana, ler teu blog me dá mais vontade ainda de fazer jornalismo!
É sério, se considere uma influência!
Se quiser, puder, tiver afim, dá uma passadinha no Eternidades! Beeeeijo!
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