Permissão para fazer nada
Conceito desevolvido por gaúcho valoriza a importância de se desenvolver o hábito de parar
Fazer nada também é aproveitar o tempo. A frase soa estranho num mundo em que o tempo está diretamente relacionado com dinheiro e produtividade. A palavra nadismo, então, surpreende. Idealizado pelo consultor criativo gaúcho Marcelo Bohrer, o conceito valoriza a importância de momentos sem compromissos ou cobranças visando qualidade de vida. “É preciso reaprender a parar, praticando nadismo sem culpa”, salienta.
A raiz do conceito está na vivência de Bohrer. Trabalhando mais de doze horas por dia, sentiu na pele os efeitos do estresse. Em 2003, sofreu um burnout, colapso físico e mental por excesso de trabalho, que o levou para o hospital. “Meu corpo já dava sinais de estar no limite, mas como a maioria, resisti em parar”, comenta. Intrigado com a relação entre o tempo e a qualidade de vida em uma sociedade alucinada, partiu para a experiência que daria origem ao conceito do nadismo. Em Londres propôs em meio a Liverpool Street, movimentada estação de metrô, que os pedestres aprendessem a fazer nada por dez minutos ao custo de dez libras. Houve incentivos e elogios à idéia, mas ninguém parou. “Elas tinham dez libras, mas não dez minutos”, conclui. Seria preciso ir além. Para fazer com que as pessoas se permitissem parar, surgiu a proposta do Clube de Nadismo. Nele são realizados encontros onde os associados reúnem-se para desfrutar quarenta e cinco minutos de puro ócio em belos parques. Com uma “atividade” oficial e horário marcado na agenda, o ato de parar é justificado e, então, aproveitado sem qualquer sentimento de tempo perdido ou culpa. O Clube legitima a importância do não-fazer em meio a um cotidiano atribulado.
Hoje, já são mais de cinco mil sócios espalhados pelo Brasil e pelo mundo que tem como símbolo o cubo branco. É também o cubo branco, que representa o vazio, a marca nos locais dos encontros nas mais diferentes cidades. Em Agosto de 2008, ocorreram os primeiros eventos internacionais em Londres e Munique. A próxima edição deve ocorrer em Nova York no início de 2009. Lá, os sócios desfrutarão de momentos de nadismo em pleno Central Park. Embora o criador acredite que os encontros proporcionem um astral de serenidade propício para os ansiosos, a idéia é que, com o tempo, os sócios consigam inserir pequenas pausas para a prática do nadismo no seu cotidiano. “A proposta é que se adote o hábito de parar de vez em quando para fazer nada. Dez minutos já podem ajudar”, esclarece. A psicóloga e doutora em “Ócio e Potencial Humano” pela Universidade de Deusto na Espanha, Ieda Rhoden apóia o movimento, “É preciso ensinar a parar, este é o valor da proposta”. Tatiana Jacobsohn, 23 anos, sócia do clube, acredita que numa sociedade em que cada vez mais as pessoas querem ter tudo, o que realmente precisam, muitas vezes é “um pouco de nada”.
Para aqueles que não são adeptos da idéia, o difícil parece ser compreender o que é exatamente fazer nada. Nos encontros do Clube, os sócios recebem tapetes e acomodam-se na grama. É preciso não ter pensamentos produtivos, apenas relaxar. “Não tem propósito. Toda a atividade que a pessoa desenvolva com um objetivo definido não pode ser considerada nadismo”, esclarece o fundador do clube. Assim, dormir, assistir televisão ou conversar estão fora de questão. Praticar o nadismo é dedicar-se exclusivamente a fazer nada aproveitando o tempo livre e descompromissado.
Em 2008, Bohrer lançou um livro que esclarece por completo o nadismo e ensina, passo a passo, como fazer nada. Nadismo – Uma Revolução Sem Fazer Nada (Editora MegaLivro, 165 páginas, preço médio R$30, 00) faz o leitor compreender a importância de inserir pequenos momentos de ócio em sua rotina através do conceito revolucionário de que fazer nada também pode ser uma forma de aproveitar o tempo com qualidade. Há, ainda, as quatro diretrizes (Stopnjoy; Entregue-se; Sossegue; Observe.) que auxiliam no sucesso da prática. “Me dei conta de que o ato de fazer nada estava banido da cultura contemporânea como se fosse um pecado mortal. A proposta é que se escolha, às vezes, fazer nada de propósito permitindo-se desfrutar desse tempo, o que é praticamente um luxo hoje”, reforça. O livro recebeu o apoio do jornalista britânico Carl Honoré, autor do best seller Devagar, que há anos trabalha em prol da melhor qualidade de vida a partir da boa administração do tempo.
Em meio a vida corrida, ao estresse e as cobranças excessivas da nossa sociedade, o nadismo surge como uma outra possibilidade para os que visam uma vida com qualidade. “É a permissão para parar, foi criado para abrir uma brecha, dar a oportunidade. Para subverter o sistema”. Ainda segue na contramão dos valores que hoje nos sustentam e que fazem com que quase 70% dos brasileiros sofram de estresse. No entanto, o número de sócios do Clube, basta entrar no site (www.clubedenadismo.com.br) e associar-se gratuitamente, cresce a cada dia. A palavra que hoje ainda soa estranho aos ouvidos ansiosos e estressados – nadismo- começa a ser compreendida como prática que visa, principalmente, o bem viver. O consultor criativo sintetiza, “As pessoas tem o direito de ter uma vida saudável e com qualidade. Elas tem o direito de parar”.
Por Mariana Müller
2 comentários:
Eu já conhecia o Clube. Acho a ideia muito boa, mas confesso que é realmente difícil escolher um tempo pra fazer nada. Seja por esquecimento, pela correria do dia-a-dia... Mas sempre que posso e lembro, dou um tempo pra mim mesma e pras minhas ideias!
Bj
Estamos falando de nadismo? sim!
praticando? sim!
parabens!
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